Dizem que escrever é uma forma de Auto amor.

Mas eu acho que escrever nada mais é do que emprestar a própria atenção a si mesma.

É o olhar para dentro, e ver o que temos de mais íntimo e criativo dentro de nós.

Já ouvi por aí dizer que “escrever poupa-nos idas ao psiquiatra”.

Assim sendo…

Pouparei decerto idas ao psiquiatra. E espero com isso levar alegria e amor a todos vocês.

sexta-feira, 26 de julho de 2013

Acordou mais tarde do que o normal, mesmo para um domingo.
Pegou no telemóvel e viu as horas, já passavam das onze, puxou o lençol até ao pescoço, aconchegou-se e resolveu ficar mais uns minutos, afinal nada tinha para fazer.Mas o barulho vindo do andar de cima incomodou-a e resmungando, lá se levantou.
Foi à cozinha, encheu um copo com leite e dirigiu-se à varanda…
Comprara aquele apartamento precisamente por causa da varanda, espaçosa e virada para o rio, já ali estava há seis meses, e só hoje teve tempo para lá ir.
As reuniões tardias, as viagens em trabalho, as noites passadas em frente ao computador a terminar trabalhos que nunca tinham fim, tudo isso a tinha afastado da varanda tão desejada.
Só agora se dava conta do excelente trabalho do decorador, tinha duas poltronas, uma linda mesa de tampo dourado e uma chaise longue tudo em bege escuro, as plantas serpenteavam a varanda, bem cuidadas e floridas. Sorriu ao olhar para as margaridas… a sua leal empregada não descurava de nada, nem o mais ínfimo pormenor.
Encostou-se ao parapeito e ficou a olhar o rio e as pessoas que passeavam na rua, nunca tinha tempo para o fazer, hoje sentia-se estranhamente melancólica. Bebeu metade do leite e foi arranjar-se para sair. Olhou para a imagem reflectida  no espelho, franziu o sobrolho e pensou que até nem era feia, os cabelos negros bem tratados e  levemente ondulados chegavam pelos ombros, passou os dedos pelos lábios carnudos e pensou há quanto tempo não eram beijados. Deslizou a ponta dos dedos pelo pescoço e parou no espaço entre os seios, despiu a camisola e ficou a olhar, eram pequenos e arredondados, podia tê-los modificado, mas gostava deles assim. O ventre é plano, a maternidade tinha sido adiada e agora no alto dos seus 36 anos achava ser tarde demais.
Sentou-se na banheira e deixou a água a correr até ficar pelo pescoço, pensou nele…e depois de alguns anos as lágrimas fortemente guardadas, soltaram-se em cascata.
Quando em adolescente fora preterida por ele e pela família por não ter dinheiro e ser filha do mecânico da aldeia, Joana jurou para si mesma que um dia voltaria para esfregar na cara deles um diploma e uma carreira de sucesso.
Com o passar dos anos ela conseguiu tudo isso e muito mais, mas nunca mais voltou à aldeia.
Chegou à conclusão que ele não valia o bilhete de comboio, então porque é que justo hoje sem motivo aparente ela pensou nele e chorou?!...